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ARTIGO TRIBUTÁRIO

Decisões judiciais e Imposto de Renda da Pessoa Física

Neste artigo, o especialista comenta sobre o IRPF e as decisões na justiça a respeito do tema.

09/08/2023 15:45

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Decisões judiciais e IRPF

Decisões judiciais e Imposto de Renda da Pessoa Física Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Lembro-me de ter participado de um seminário internacional sobre tributação pelo Imposto de Renda da Pessoa Física, já há algum tempo, na capital das alterosas, Belo Horizonte, durante o qual a fala de uma ilustre palestrante me chamou muito a atenção.

Em sua exposição, ela frisou que, com o tempo, teríamos significativas mudanças no alcance da tributação e que muitas verbas, naquele momento, classificadas como tributáveis, deixariam de sê-lo. Como hoje já acumulo 30 anos de atuação no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) , um recorte de tempo razoável para se observar mudanças, compartilho com você, paciente leitor, paciente leitora, alguns casos que confirmam a tese ouvida lá em Belo Horizonte.

Uma maneira disso ocorrer é através da propositura de projetos de lei que, quando aprovados, modificam o alcance da tributação. A outra, da qual me ocupo nesta conversa, é quando o sujeito passivo, o cidadão, recorre ao judiciário por se sentir injustiçado ao receber determinada tributação.

E reiteradas decisões a favor do contribuinte e contra a Fazenda Nacional geram efeitos na tributação de todos.

Antes de enumerar alguns casos, lembro que o artigo 19 da Lei 10.522, de 19 de julho de 2002, disciplina o comportamento do fisco quando ocorrem decisões desfavoráveis à Fazenda Nacional, em especial quando em sede de recurso repetitivo junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de repercussão geral, para o caso de decisões do Supremo Tribunal Federal.

Para quem quiser se aprofundar, recomendo a leitura dos dispositivos elencados neste artigo e também os artigos 18 e 18-A do mesmo diploma legal.

É em função desse regramento, que é comum você encontrar no “Perguntão da Pessoa Física” respostas dizendo que determinada verba é tributável e depois, no box denominado “atenção”, a explicação de que a Receita Federal não constituirá o crédito tributário, ou seja, não vai lançar o tributo em decorrência de atos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN). A quem quiser conferir um exemplo, recomendo, no Perguntão 2023, uma análise atenta à pergunta nº 175, que trata do assunto “Férias”.

Isso ocorre porque a lei que diz que aquela verba é tributada pelo imposto de renda continua em vigor, mas existem decisões em contrário, na forma do artigo 19 da Lei 10.522/2002.

Aliás, aproveito o tema para lembrar que a Receita Federal recentemente segmentou, e mantém em destaque em sua página na rede mundial de computadores, a jurisprudência vinculante de diversos assuntos, e não apenas do IRPF. Muito útil para quem atua na área!

Começo o rol exemplificativo com as desapropriações, que, até bem pouco tempo, só se considerava como não alcançadas pela tributação os valores recebidos pela desapropriação para fins de reforma agrária, na forma do disposto no § 5º do artigo 184 da Constituição Federal.

Hoje, qualquer forma de desapropriação, seja por utilidade pública ou por interesse social, passou a não ser alcançada pela tributação, por se constituir em mera reposição, a valor justo, do patrimônio expropriado, seja de forma amigável ou judicial. 

Isso se deu a partir de reiteradas decisões contrárias ao fisco e da pacificação via tribunais superiores. Administrativamente, temos a Súmula do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (CARF) nº 42, com efeito vinculante, e o item 69 da Nota PGFN nº 1.114, de 14 de junho de 2012.

Outras verbas que tiveram mudança de tratamento a partir de decisões da justiça são as referentes aos juros recebidos em ações ou acordos trabalhistas, que, desde março de 2021, por força do julgamento do famoso Tema 808 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não são mais alcançadas pela tributação pelo Imposto de Renda da Pessoa Física. 

A lógica aqui é a mesma do item anterior: os juros apenas repõem a perda inflacionária decorrente da passagem do tempo, e não representam variação patrimonial positiva, objeto do imposto de renda. 

Também em decisão recente do STF, esta do ano passado, a pensão alimentícia recebida passou a não ser mais tributada pelo Imposto de Renda da Pessoa Física, lembrando que, na outra ponta, limitado ao constante na sentença ou escritura pública, o valor continua sendo dedutível para quem paga a pensão.

Um outro caso interessante é o fim da restrição ao uso da isenção do valor da venda de imóvel residencial para quitação, total ou parcial, de débito remanescente de aquisição a prazo ou prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante na data da venda. 

Esta isenção decorre do artigo 39 da Lei 11.196 de 2005, e o STJ considerou ilegal a restrição contante do inciso II do artigo 2º da Instrução Normativa SRF nº 599 de 2005, por não existir na Lei.  

E para encerrar essa pequena lista exemplificativa que decidi compartilhar com vocês, trago dois casos que envolvem o ganho de capital, ambos ainda sem decisão com efeito “erga omnes”, e, portanto, não alinhado ao tratamento que citei há pouco do artigo 19 da Lei 10.522, mas que sinalizam uma tendência de mudança de entendimento com validade futura para todos.

Falo do ganho de capital para doações em adiantamento da legítima, objeto de decisão do STF, sem repercussão geral, de fevereiro deste ano, e também da tributação pelo ganho de capital em alienação de precatórios, objeto de decisão do STJ, de dezembro de 2022, sem a sistemática do recurso repetitivo.

Em ambos os casos, o voto vencedor se baseia na não ocorrência do fato gerador do ganho de capital. Na doação em adiantamento da legítima, não há acréscimo patrimonial disponível econômica ou juridicamente para o doador, que, ao invés de ter um ganho de capital, tem uma perda de capital.

A mesma lógica embasou a decisão do STJ para a alienação do direito creditório representado pelo precatório. Como a alienação ocorre com deságio, também aqui, ao invés de um acréscimo patrimonial, de um ganho de capital, tem-se, na verdade, uma perda de capital.

Reforço que, para esses dois últimos casos que citei, não há, ainda, qualquer efeito vinculante para o fisco, e qualquer pleito nesse sentido deverá ser feito via ação judicial.

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