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Cláusulas de resolução de disputas no Contrato Social

Na construção de um bom contrato social, é importante que os empresários fujam da tentação de modelos prontos, que não possuem cláusulas importantes como as de resolução de disputas - fundamentais para a perenidade de qualquer organização.

05/10/2023 17:30

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Contrato Social: cláusulas de resolução de disputas

Cláusulas de resolução de disputas no Contrato Social

O Contrato Social é o documento societário mais importante para qualquer empresa, uma vez que estabelece todo o regramento das obrigações dos sócios entre si e com a organização. Porém, apesar de ser absolutamente fundamental (em todo os sentidos dessa palavra, aliás, pois é por meio dele que a empresa é “fundada”, ou seja, constituída), muitas vezes empreendedores negligenciam as nuances da confecção de um bom Contrato Social, recorrendo a modelos prontos encontrados na internet.

Essa (má) prática faz com que empresas deixem de contar com algumas proteções importantes disponíveis na legislação brasileira, uma vez que acaba por ignorar temas como sucessão empresarial, regras para ingresso de terceiros na sociedade, direito de preferência ou de primeira oferta, ou formas de resolução de disputas.

Normalmente, os modelos disponíveis trazem uma cláusula genérica de resolução de disputas via Poder Judiciário, com foro na comarca da sede da empresa. Trata-se da solução menos adequada para a realidade empresarial, porque não traz qualquer preocupação relacionada à prevenção do conflito entre sócios.

Para tanto, existem alternativas previstas no Direito brasileiro (tanto na legislação quanto construídas pela prática da advocacia empresarial), e que podem auxiliar na construção de cláusulas de contratos sociais voltadas à prevenção e solução de conflitos entre os sócios sem a necessidade de batalhas judiciais, como negociação, mediação e arbitragem.

1. Negociação

Dentre as diversas hipóteses para resolução de disputas, a negociação é o método mais célere e com menores formalidades. E, ainda que negociar seja algo extremamente natural no dia a dia de qualquer empresário, quando se fala em negociação como “método de resolução de disputas societárias” é importante estabelecer regras prévias.

O Contrato Social poderá, por exemplo, prever inicialmente uma cláusula escalonada (o que significa que as partes deverão necessariamente passar por um período de negociação que, caso infrutífera, levará à mediação; e, caso seja impossível a mediação, buscarão a solução via arbitragem), e detalhar o procedimento negocial em Acordo de Sócios.

No caso da resolução de disputas societárias, é interessante que o procedimento detalhe um prazo para sua conclusão, a fim de que nenhuma das partes busque “vencer pelo cansaço”, e estabeleça sanções (por exemplo, a ausência de resposta em determinado prazo levará ao encerramento do processo de negociação). Além disso, em casos de impasses societários, é lícito estabelecer as chamadas deadlock provisions, como cláusulas de compra e venda forçada (que também seguem processo próprio de negociação), evitando a perenidade do conflito por meio do estabelecimento de regras claras e consensuais.

2. Mediação

Com legislação própria no Brasil, a Lei Federal nº 13.140/2015, a mediação é um procedimento extrajudicial em que as partes são auxiliadas a construírem uma solução consensual para o problema, com a participação de um mediador.

O mediador é um terceiro de confiança das partes em conflito, imparcial (sujeito às mesmas regras de imparcialidade que os juízes de direito), e que atuará como um facilitador para a construção da solução pelos próprios sócios – o mediador, em regra, não apresenta nem sugere soluções, mas auxilia na identificação das reais necessidades e interesses envolvidos. Com isso, não se busca apenas solucionar o problema colocado em discussão, mas também reparar a relação pessoal entre os sócios, algo fundamental para a continuidade da relação societária.

A mediação é, por lei, sigilosa, o que representa outra vantagem desse método. Como os conflitos societários por vezes envolvem decisões estratégicas ou segredos do negócio, a existência de um processo judicial público (que somente será sigiloso nas poucas hipóteses previstas em lei) pode causar prejuízos à reputação da empresa ou expor questões sensíveis a concorrentes, enfraquecendo sua posição de mercado.

O procedimento de mediação poderá correr em uma câmara previamente escolhida pelas partes (nesse caso, é interessante que o próprio Contrato Social ou acordo de sócios já contenha uma cláusula de mediação com a indicação da câmara), ou mesmo de maneira mais informal, a partir de um mediador escolhido de comum acordo (normalmente alguém de confiança das partes, podendo ser um Conselheiro Consultivo que já tenha desempenhado bons serviços para a empresa e que tenha demonstrado a imparcialidade necessária para não beneficiar ou prejudicar quaisquer dos sócios envolvidos na disputa).

3. Arbitragem

Caso a mediação ou a negociação fracassem, há ainda uma outra alternativa para que os sócios busquem resolver seus conflitos fora do Poder Judiciário, que é a arbitragem.

O procedimento arbitral é regulado pela Lei Federal nº 9.307/1996, e por meio deles os sócios transferem a um árbitro (ou painel de árbitros, por vezes chamado de “Tribunal Arbitral”) a responsabilidade por resolver a disputa de maneira definitiva.

Assim, se na negociação e na mediação as próprias partes devem construir a solução para a disputa, na arbitragem essa responsabilidade cabe a um terceiro.

Ainda que as grandes câmaras possuam custos elevados (o que inclusive serve como estímulo à prevenção do conflito ou solução negociada), a arbitragem possui algumas vantagens que fazem dela uma ferramenta muito interessante para a resolução de conflitos.

Ao instaurar o procedimento arbitral, as partes possuem maior liberdade para a definição não apenas do procedimento, mas dos prazos para conclusão do processo. Isso significa que, ao contrário de uma disputa judicial, que poderá perdurar indefinidamente até uma decisão de mérito, no processo arbitral já se sabe de antemão quando será proferida a sentença. Além disso, não existe recurso possível contra a decisão (apenas possibilidade de pedidos de esclarecimento), que se torna definitiva e pode inclusive ter seu cumprimento forçado via Judiciário.

Outro ponto muito valioso sobre a arbitragem é que as partes poderão escolher um árbitro que seja altamente especializado no tema colocado em debate, e que sequer precisa ser advogado. Assim, se um dos pontos de controvérsia entre as partes envolve a metodologia de valuation para definir o quinhão de cada sócio em uma dissolução de sociedade, é possível que o árbitro escolhido seja um contabilista, economista ou administrador de empresas – o que aumenta as chances de uma decisão mais adequada ao caso.

E, tal qual a mediação, a arbitragem costuma correr em sigilo, o que reduz a exposição da empresa perante o mercado e protege seu valor, além de diminuir o desgaste público dos sócios com concorrentes, clientes e demais parceiros comerciais.

Na construção de quaisquer das cláusulas mencionadas acima, é possível inclusive que os sócios estabeleçam quais assuntos estarão sujeitos a qual método, levando em consideração o custo, valores envolvidos, sensibilidade do tema etc, garantindo com isso uma adequada gestão dos conflitos que naturalmente surgem no cotidiano de qualquer empresa. Além disso, caso haja mais do que dois sócios, é plenamente lícito que se estabeleçam diferentes regras via Acordo de Sócios (desde que não se contrarie a lei ou o Contrato Social).

Atualmente, aliás, os métodos adequados de resolução de disputas (antigamente chamados de métodos “alternativos”) estão cada vez mais acessíveis graças a diversas lawtechs dedicadas ao oferecimento de soluções de resolução online de disputas (ou online dispute resolutions – ODRs), reduzindo seus custos e facilitando sua utilização.

 Portanto, é bastante interessante que empresários recebam o adequado assessoramento para a construção de boas cláusulas de resolução de disputas, o que pode significar a diferença entre a sobrevivência ou não do negócio em caso de impasses mais graves.

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