Em meio à pandemia do coronavírus, outro vírus de rápida proliferação e risco de fatalidade preocupa os empresários contábeis: a inadimplência. O relato de vários contadores é de que aumentaram os pedidos de clientes de isenção de honorários. Existem formas inteligentes de se cobrar do cliente tais honorários, de ter o controle das negociações a fim de mitigar os prejuízos.
O primeiro conceito a ser trabalhado é de que recebe primeiro quem cobra mais. Isso significa que seu departamento de cobrança tem de ser mais ativo e fazer o que é chamado de follow up, acompanhamento para que o inadimplente torne-se adimplente.
Vamos apresentar soluções que já são empregadas no mercado contábil, inclusive no meu negócio. Existe um estilo de cobrança A.C, antes do coronavírus e D.C, depois do coronavírus. No período A.C, um dia após o vencimento do pagamento, o cliente recebia um email:
“Olá, Fulano. Tudo bem? O banco não identificou seu pagamento. Podemos emitir um segundo boleto para sexta-feira?”.
Observe que já era deixado uma nova solução com data. O uso do email é porque ele formaliza o que se quer falar. Se o cliente continuasse sem pagar, o segundo contato era por ligação.
A ligação era na tentativa de sanar o problema. Porém, o contrato praticado já traz algumas questões. Após o primeiro dia de vencimento há multa de 2% e juros de 1% ao mês. Se chegasse ao caso de passar de dois meses, há uma outra cláusula no contrato que rege que na ausência de pagamento após esse período gera suspensão dos serviços. O empresário não receberia a folha de pagamento dos funcionários nem quaisquer outros documentos.
E ainda era possível a negativação junto ao SPC do nome da pessoa jurídica e do sócio administrador. Essas medidas protegem o contador da inadimplência. E tal modelo de contrato pode ser disponibilizado para quem tiver interesse.
Com o coronavírus, as medidas de cobrança tiveram alterações. Invés de enviar email, ligue. A ligação é uma forma mais direta. O WhatsApp também pode ser usado nesse sentido.
É importante que nesse momento de muitas mudanças, o empresário diga de que maneira ele está sendo afetado para o contador consultor ver de que modo pode resolver. Isso tendo a palavra dele de que será mantido o pagamento dos honorários em dia.
Provavelmente o seu contrato não tem cláusulas como as descritas acima. Porém você pode alertar ao cliente que o fato dele não pagar fere o artigo 476 do código civil que diz que “nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro”. Isso pode provocar suspensão imediata dos serviços.
MPs como moeda de troca
Se você ainda não adotou medidas provisórias (MPs) como moeda de troca em seu negócio contábil está colocando muita coisa em risco, contador! Durante as negociações é fundamental que o contador saiba usar as medidas provisórias (MPs) 927 e 936 lançadas pelo governo como moeda de troca. A tendência é que empresário fale para o contador que por conta de tudo o que está acontecendo não está conseguindo vender e não vai conseguir pagar o honorário.
Você tem de reforçar para o cliente que todas essas mudanças geram custo com hora-homem para realizar, por exemplo, uma suspensão de contrato de funcionário. E que todas essas ações governamentais são extraordinárias, que previamente não estão no contrato.
Nesse discurso você tem de provar ao seu cliente o valor que você agrega a ele, sua importância. Vamos dar um exemplo: “São serviços que estão sendo realizados de graça, pela parceria que existe entre nós. Estamos juntos. Eu preciso apenas que você mantenha em dia meus honorários, pois nossos esforços estão sendo para salvar sua empresa”.
As contabilidades online mesmo estão cobrando taxas extras diante das demandas que os empresários têm solicitado. Isso porque aumentou exponencialmente para todos os contadores o trabalho.
Você também precisa usar o gatilho mental da ancoragem para liderar as negociações. A tendência de todos os clientes é querer baixar os valores mais e mais. Pensando na saúde de seu negócio calcule uma perda máxima. Vamos supor: 15%. Em cima desse valor faça uma primeira ancoragem com um percentual menor: 10%. A aplicação:
“Meu cliente, a minha margem de lucro é de 10% em cima do contrato. Eu vou pagar para trabalhar e lhe dou um desconto de 15%. Estou lançando todas as minhas forças para manter você atualizado e isso exige um tempo diferenciado da minha equipe. Vamos atravessar essa juntos”.
Classifique os inadimplentes
Existe um método chamado curva ABC que traça perfis de clientes. Também conhecida como regra de Pareto, a técnica pressupõe que 80% do seu faturamento vem de apenas 20% de sua base de clientes. Vamos analisar isso de acordo com segmento das empresas devedoras.
Classifique como clientes A os empresários que estão crescendo em meio à crise. Podem ser negócios cujas entregas são por internet, farmácias, empresas que vendem EPIs, supermercados. Em caso de inadimplência o diálogo deve ser no sentido de que é preciso de compreensão por parte desse empresário visto que o faturamento dele está aumentando por conta da crise.
Os clientes categoria B são os donos de organizações que sentiram o impacto, mas conseguem passar pela crise. A negociação deve ser usando as MPs como moeda de troca.
Coloque como C aquelas empresas que foram bastante impactadas pela crise. Uma das soluções é que você acorde com ele um esquema em que ele pague metade dos honorários e a outra parte devida pagar meses à frente. Você assume riscos, mas também faz parte do jogo.
Por fim, os que serão classificados como D são aqueles empresários que antes da crise já não pagavam em dia. E que com a pandemia reforçam seu posicionamento que não tem dinheiro para pagar. Os antecedentes já mostram que esse empresário passou de cliente para devedor e, por conta disso, o ideal é suspender o contrato.
É fato que os casos de atraso ou não pagamento por parte dos clientes não tem como serem eliminados. Porém, o cenário ideal é usar táticas de negociação que garanta que sua empresa não perca oxigênio e atravesse essa crise de maneira mais otimizada.