Nesses últimos meses, a reforma tributária tem sido uma das questões mais debatidas e polêmicas, porém, como contador indignado com o manicômio tributário em que nos metemos, venho acompanhando esse tema há mais de 7 anos, num tempo em que ninguém dava bola para a reforma, nem mesmo a imprensa ou os profissionais envolvidos. Agora, fica parecendo que não houve tempo de discussão, quando na verdade, já está mais do que discutida a matéria nesses tantos caminhando sem acompanhamento da sociedade nas audiências públicas, reuniões, debates e muito mais e tratando diretamente com os envolvidos na reforma que não é de governo, mas do congresso nacional.
Ultimamente temos ouvido a pergunta que não quer calar: essa reforma vai melhorar ou piorar a nossa situação? Convido você a refletir e acompanhar comigo os próximos capítulos dessa história.
Centralização de poder / aumento de impostos
Muito mais do que uma mudança legislativa por parte do governo federal, visando aumentar a arrecadação e concentrar o poder central, por meio da centralização do recolhimento dos impostos, como muitos tem de forma apocalíptica tem repetido aos borbotões na internet, quero lhes apresentar uma nova perspectiva sobre o que é esta reforma.
Nesses mais de 30 anos de experiência em contabilidade e análise tributária, vi como cada mudança impactou nosso dia a dia. Desde a criação do Simples Nacional, a escalada da substituição tributária, até o aumento de impostos sobre empresas de serviços, observei as múltiplas faces da nossa carga tributária. A carga tributária do Brasil, já ultrapassando 34% do PIB (quase dois “quintos dos infernos”), reflete uma das mais altas cargas de impostos do mundo e, que, com a reforma, torna-se muito mais transparente.
Governadores contra?
Agora a reforma tributária foi aprovada no Senado e entrou em fase decisiva. Entre as mudanças significativas que aconteceram, estão a criação de um teto para a carga tributária sobre o consumo e regimes diferenciados de tributação para setores específicos. Contudo, há uma polêmica dos governadores do sul e sudeste, que se posicionaram contra a reforma, que segundo eles, carece de ajustes de quórum de votação futura no fundo e de critérios de proporcionalidade para dividir o poder de decisão entre os estados. Isso se torna crucial especialmente no contexto do fim dos benefícios fiscais em isenções de impostos.
Mitos e fatos
Pra começar a acabar com mitos, ela sequer é projeto do governo federal, este, sim, tem apoiado, por meio da criação de secretaria específica, composta por um dos autores das propostas legislativas que foram recentemente aprovadas no senado. E tem apoiado porque sabe que ficará na história como governo que promoveu a maior revolução para o ambiente de negócios das ultimas décadas no Brasil, ou seja: quer ser o “pai da criança no futuro”.
Estamos com essa medida, a um passo em direção à modernização do nosso sistema tributário, chamado por muitos de manicômio tributário. Como contador, autor de livros, professor de MBA, e co-fundador de um Think Tank, de apoio na melhoria do ambiente de negócios, vejo de perto os desafios e as oportunidades que a reforma tributária traz. Trilhões reais em brigas no contencioso, milhões de multas por uma cascata de obrigações acessórias (centenas de declarações eletrônicas para todos os entes federados) , sonegação e inadimplência, fazem parte desse ambiente.
Modificações desfiguram a reforma?
A reforma, que agora ganha contornos mais definidos com a recente aprovação no Senado, traz consigo uma série de modificações no texto original, porém, apesar do medo da população em relação às mudanças, via emendas dos deputados e senadores, a estrutura dorsal da reforma não foi afetada e produzirá os efeitos desejados, sem maiores transtornos. Lembremos: já temos o pior sistema tributário do mundo, indiscutivelmente, assim tudo que vier para melhorar, será bem vindo.
Em sua essência, a modificação tributária na constituição, busca simplificar um sistema notoriamente complexo e oneroso. Por anos, falei sobre a carga tributária brasileira, que é uma das mais altas do mundo, e como ela impacta tanto o cidadão comum quanto o empreendedor, com a enxurrada de complexidade, declarações acessórias eletrônicas, cada uma com um prazo, regras muito intricadas e multas, maiores que outras.
Agora, com as mudanças propostas, estamos à beira de uma nova era fiscal, gerando mais transparência e eficiência. Não está sendo reinventada a roda, estamos chegando atrasado a um sistema que já existe há mais de 50 anos, que é adotado por mais de 170 países.
As alterações mais notáveis na reforma incluem a unificação de cinco tributos em um único Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Isso representa uma mudança significativa, especialmente para os consumidores, que há anos lidam com um sistema tributário que é complexo e, muitas vezes, injusto. Ao longo dos meus anos de experiência, vi como essa complexidade pode sufocar negócios e confundir os consumidores. A promessa de um sistema mais simples e direto é, sem dúvida, uma luz no fim do túnel.
Resumo das características, modificações relevantes e isenções aprovadas no senado:
O cálculo para a alíquota padrão considerará a média da arrecadação com os cinco impostos que serão extintos pela reforma, propondo um teto de referência para evitar o aumento da carga tributária.
Adoção do Imposto sobre Valor Agregado (IVA): Um sistema adotado por mais de 170 países para simplificar processos e reduzir burocracia.
Fusão de impostos federais na CBS: IPI, PIS e Cofins extintos com adoção da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) .
Fusão dos Impostos Estaduais e Municipais: O ICMS e o ISS extintos com adoção do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) , cobrado no destino.
Introdução do Imposto Seletivo (IS): Substituirá o IPI e aplicado a produtos e serviços nocivos à saúde e ao meio ambiente.
Manutenção da Carga Tributária: Não haverá aumento na carga tributária, com mecanismos de ajuste previstos para 2030 e 2035.
Modernização e Não Cumulatividade: Os novos impostos serão calculados automaticamente, abatendo sempre o valor pago na etapa anterior, pelas empresas em qualquer tipo de gasto (exceto com folha de pagamento) .
Isenções e benefícios concedidos
Isenção de Impostos para a Cesta Básica Nacional de Alimentos, Além de uma versão estendida da cesta básica com tributação reduzida.
Legumes, verduras, frutas, ovos e remédios terão isenção total de impostos, alguns produtos de higiene e limpeza também serão isentos.
- Setores com Alíquotas Reduzidas: 60% de redução de tributos para 13 setores específicos, incluindo educação, saúde, transportes coletivos, alimentos para consumo humano, produtos de higiene pessoal para famílias de baixa renda, entre outros;Regimes Diferenciados: Setores como combustíveis, serviços financeiros, hotelaria, telecomunicações, e atividades esportivas terão regimes de cobrança diferenciados;Isenção para Templos Religiosos: Continuarão isentos de impostos;Inclusão de IPVA para Lanchas e Jatinhos: Será criado um novo imposto para esses itens de luxo (será destinado para municípios);
- Produção de Hidrogênio Verde: Pode ter um regime fiscal diferenciado;
- Profissionais Autônomos/Eventos/PCD: Possibilidade de reduzir alíquotas na prestação de seus serviços em 30% para serviços de autônomos. E redução para setor de eventos, além de veículos para portadores de deficiências e autistas (este ultimo algo que hoje já existe).
Fundos
O fundo para substituir as isenções fiscais que não existirão mais, foi elevado de 40 para 60 bilhões de reais.
Mudanças na forma de votação entre os estados para o fundo que mencionei, o que desagradou governadores da região sul e sudeste.
Controvérsias, mitos e desinformações
Como sempre acontece com uma reforma, as mudanças não são sem controvérsias. A inclusão de isenções para determinados setores e produtos, como o setor de eventos e para pessoas com deficiência na compra de veículos, levanta questões sobre o equilíbrio entre justiça fiscal e necessidade econômica. Essas isenções, embora possam parecer benefícios imediatos para alguns, também trazem consigo o desafio de manter um sistema fiscal equilibrado e sustentável.
Maior alíquota de IVA do mundo
Outro ponto de destaque é a questão da mais alta alíquota de IVA do mundo, que muitos tem alardeado. A reforma tem justamente o poder de trazer maior consciência sobre o montante de tributos que pagamos sobre o consumo. E por isso que ela eleva a alíquota final, necessária para manter a mesma arrecadação atual, por causa da inclusão de isenções a várias categorias, que reduzem o montante arrecadado pelo governo, e consequentemente fazendo com que a sociedade como um todo seja chamada a complementar a arrecadação que faltar, até atingir novamente o valor total já arrecadado. Por isso, que a alíquota final do IVA brasileiro está chegando a 27,5%. E quanto mais se puxa “o cobertor” mais descoberto fica os pés ou a cabeça.
Por anos, a falta de transparência no nosso sistema tributário obscureceu o verdadeiro custo dos impostos para o consumidor brasileiro, pois ele ficava misturado com o preço do produto (por dentro do preço). Com a reforma, este custo se torna mais visível, pois o imposto estará fora dos preços, totalmente separado e transparente, tirando os empreendedores do meio do processo, por meio de apuração e pagamento automáticos dos impostos do consumo, sem mistura-lo com o caixa das empresas, e justamente por isso que não haverá mais impostos para as empresas, pois estes estarão fora dos preços e controlados automaticamente no momento do pagamento das vendas e serviços.
Como funciona lá fora / webinário com Especialista
Inclusive além da minha atuação nos bastidores da reforma tributária, conversando com deputados e autores das PEC`s, para conhecer melhor o que viria a ser implantado no Brasil com o IVA, coordenei a Missão Coopercont Brasil x Estônia, que tem o melhor sistema tributário do mundo, e como faço parte da comissão de intercambio internacional de contabilidade do CRC RJ, quero convida-lo na próxima terça-feira, dia 14 de novembro, às 14:30, para acompanhar no YouTube do CRC RJ um webinar com o deputado Luiz Carlos Hauly, o "pai do super simples" e um dos principais articuladores da reforma tributária. Juntos, discutiremos os rumos e os desafios da reforma no Brasil.
Espero que você tenha conseguido ampliar um pouco mais sua visão sobre esse importante projeto e agora tenha mais elementos para formar sua própria opinião sobre essa matéria, polêmica, porém extremamente necessária para o país.
Somos a geração que vai mudar o sistema tributário nacional.