O entendimento foi firmado pela Turma Regional de Uniformização (TRU) dos Juizados Especiais Federais da Justiça Federal da 4ª Região que julgou um processo previdenciário em que a segurada (empregada doméstica) teve benefício negado pelo INSS sob a justificativa de que a autora da ação não teria completado o período de “carência”, exigido pela lei.
Cabe esclarecer que os benefícios previdenciários podem exigir um tempo mínimo de contribuição pelos segurados para que possam usufruir destes, e o referido período é denominado de “período de carência”.
No caso em questão, para o auxílio-doença pretendido, o tempo mínimo seria de 12 meses, e o INSS deixou de considerar o período em que a segurada efetuou contribuições com base/teto abaixo do valor mínimo.
A 1ª Vara Federal de Ijuí (RS) julgou o processo que tramitava pelo Juizado Especial e considerou a ação procedente, condenando o INSS ao pagamento do auxílio-doença em favor da segurada, contudo, a autarquia previdenciária recorreu à 3ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul que reformou a decisão, acolhendo o recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ao apontar o extrato previdenciário colacionado na sentença, com recolhimentos previdenciários a partir da competência de março/2020 efetuados abaixo do valor mínimo, de modo que não poderiam ser computados para fins de manutenção da qualidade de segurado e carência.
Inconformada a segurada apresentou um Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei para a TRU, defendendo que a posição da 3ª Turma Recursal divergiu de entendimento da 4ª Turma Recursal do RS em julgamento de processo similar.
A TRU, por maioria, deu provimento ao pedido, merecendo destaque a posição da relatora do caso a juíza Erika Giovanini Reupke, que apontou ponto nodal com o seguinte destaque: “o § 14 do art. 195 da CF/88, incluído pela EC 103/2019, passou a excluir os salários de contribuição inferiores ao mínimo legal apenas da contagem como ‘tempo de contribuição’ do Regime Geral de Previdência Social. Assim, o mencionado dispositivo da emenda constitucional, somente tratou de tempo de contribuição, sem estabelecer restrições quanto à carência ou qualidade de segurado”.
O processo ainda retornará à Turma Recursal de origem para nova decisão seguindo a tese da TRU, o tema é relevante e deve ser observado diante de mudanças significativas nos modelos de trabalho que temos observado atualmente.
O contrato de trabalho intermitente é um exemplo disso, trazido com a reforma trabalhista de 2017, neste modelo os trabalhadores podem recebem por dias de trabalho e pode ocorrer recebimento menor que um salário-mínimo, sendo que a complementação está a cargo do trabalhador, que não conhece a fundo as implicações dessa responsabilidade.
De outro lado, o sistema de seguridade não poderá se furtar da proteção aos segurados e não é de se admitir que o conjunto normativo brasileiro esteja fora da sintonia esperada para o atendimento das missões constitucionais instituídas pelo mesmo.
Fonte: processo 5000078-47.2022.4.04.7126