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ARTIGO TRABALHISTA

Práticas anticompetitivas e seus impactos no direito do trabalho

Neste artigo, o especialista Jorge Matsumoto comenta sobre as práticas anticompetitivas, analisando acordos de não contratação e a troca de informações sensíveis entre empresas.

03/07/2024 13:30

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Práticas anticompetitivas e seus impactos no direito do trabalho

Práticas anticompetitivas e seus impactos no direito do trabalho Foto: Sora Shimazaki/Pexels

No cenário atual, a interação entre práticas anticompetitivas e o mercado de trabalho tem se tornado um tópico de grande relevância, especialmente diante de investigações como a do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que envolve a indústria de saúde. 

Este artigo pretende analisar como acordos de não contratação (no-poach agreements) e a troca de informações comerciais sensíveis entre empresas podem afetar a dinâmica do mercado de trabalho, utilizando como base o caso recente do CADE.

Em 2019, o CADE iniciou uma investigação a partir de um Acordo de Leniência com várias empresas multinacionais do setor de saúde, localizadas principalmente na região metropolitana de São Paulo, acusadas de trocar informações comerciais sensíveis sobre remunerações e benefícios e de estabelecer acordos de não contratação, práticas que configuram violações à ordem econômica, restringindo a concorrência e prejudicando os trabalhadores.

Práticas como a troca de informações comerciais e os no-poach agreements podem criar um ambiente de monopsônio, em que poucos empregadores têm controle sobre o mercado de trabalho, permitindo que as empresas mantenham os salários artificialmente baixos e as condições de trabalho desfavoráveis, limitando as oportunidades de emprego e a mobilidade dos trabalhadores.

Os aspectos de direito do trabalho e direito concorrencial estão profundamente interligados, especialmente quando se trata de práticas que afetam a contratação e retenção de trabalhadores. 

O direito do trabalho visa proteger os trabalhadores, assegurando-lhes condições justas de trabalho, remuneração adequada e direitos básicos, enquanto o direito concorrencial busca manter um mercado competitivo, prevenindo abusos de poder econômico que possam prejudicar a livre concorrência.

Quando as empresas estabelecem acordos de não contratação, eliminam a concorrência por talentos, infringindo os princípios de livre concorrência e prejudicando os direitos dos indivíduos, que se veem limitados em suas possibilidades de negociação por melhores condições de trabalho. 

A troca de informações comerciais sensíveis, como salários e benefícios, permite que as empresas alinhem suas políticas de remuneração, reduzindo a concorrência e mantendo os salários baixos.

Para evitar envolvimento em práticas anticompetitivas e garantir conformidade com as leis de direito do trabalho e concorrencial, as empresas podem adotar diversas medidas preventivas. 

Primeiramente, é crucial a implementação de programas robustos de compliance que incluem treinamentos regulares sobre a legislação trabalhista e concorrencial, abrangendo uma variedade de tópicos e cenários práticos para garantir que os colaboradores compreendam plenamente as implicações das práticas anticompetitivas e como evitá-las.

Durante um treinamento, por exemplo, os empregados podem ser apresentados a estudos de caso reais que ilustram as consequências de práticas anticompetitivas, detalhando como a troca de informações sobre salários e benefícios entre concorrentes levou a uma investigação do CADE e resultou em multas significativas para as empresas envolvidas, destacando a importância de manter a confidencialidade dessas informações.

Outra parte do treinamento poderia focar em cenários hipotéticos onde os empregados são desafiados a identificar práticas anticompetitivas, perguntando como responderiam se fossem convidados para uma reunião onde se discutem estratégias de remuneração com concorrentes, sendo a resposta correta recusar participar de tais discussões e reportar o incidente ao departamento de compliance da empresa.

Além disso, os treinamentos devem incluir diretrizes claras sobre como os empregados devem agir em situações do dia a dia que podem levantar questões concorrenciais, como um gerente de RH que recebe um e-mail de um concorrente solicitando informações sobre aumentos salariais planejados, devendo estar treinado para não responder e imediatamente relatar o incidente ao departamento de compliance.

Os programas de compliance também devem promover uma cultura de transparência e ética dentro da empresa, por meio de campanhas internas que reforçam a importância da concorrência justa e dos direitos trabalhistas, como a criação de um portal interno onde os empregados podem acessar recursos sobre compliance e legislação, assistir a vídeos educacionais e participar de quizzes interativos para testar seu conhecimento sobre práticas anticompetitivas.

Além disso, as empresas podem instituir auditorias internas regulares para revisar práticas e políticas de RH, garantindo que estejam em conformidade com as leis trabalhistas e concorrenciais, identificando áreas de risco e proporcionando oportunidades para corrigir práticas inadequadas antes que se tornem problemas legais, como a revisão de contratos de trabalho com cláusulas de não concorrência excessivamente restritivas.

Outro aspecto importante é estabelecer canais de denúncia anônima, onde os empregados podem relatar práticas suspeitas sem medo de retaliação, com esses canais sendo amplamente divulgados e os colaboradores incentivados a usá-los sempre que observarem comportamentos que possam violar as leis concorrenciais ou trabalhistas.

A empresa também pode organizar workshops e seminários com especialistas em direito do trabalho e concorrencial para aprofundar o conhecimento dos empregados sobre esses temas, abordando, por exemplo, como a legislação trabalhista protege os direitos dos trabalhadores e como a legislação concorrencial promove um mercado justo e competitivo.

Para complementar esses esforços, é útil que as empresas mantenham uma comunicação contínua sobre a importância do compliance, utilizando boletins informativos, e-mails internos e reuniões de equipe para reforçar a mensagem, criando um ambiente onde o compliance é valorizado e priorizado, garantindo que todos os empregados estejam alinhados com os objetivos de conformidade da empresa.

Em resumo, a implementação de programas robustos de compliance com treinamentos regulares e exemplos práticos é essencial para garantir que os empregados compreendam as implicações das práticas anticompetitivas e saibam como agir de acordo com a legislação trabalhista e concorrencial, protegendo a empresa de riscos legais e promovendo uma cultura de ética e integridade.

O passo inicial para isso é a capacitação contínua dos colaboradores, com treinamentos periódicos sobre as leis de concorrência e de trabalho, incluindo estudos de caso reais, como o caso do CADE, para ilustrar as consequências das práticas anticompetitivas.

Em seguida, é necessário evitar a troca de informações comerciais sensíveis com concorrentes, com discussões de mercado sendo feitas de forma anônima e agregada, sem detalhes específicos que possam levar a acordos implícitos sobre salários e benefícios, estabelecendo políticas internas claras sobre o que pode e não pode ser compartilhado com concorrentes.

A revisão regular das práticas internas e políticas de RH é outra medida essencial, garantindo conformidade com as leis concorrenciais, incluindo a análise de contratos e acordos para identificar cláusulas que possam ser interpretadas como restritivas à concorrência, instituindo auditorias internas regulares com apoio de consultorias especializadas em compliance, que podem auditar as práticas e fornecer recomendações de melhoria.

Promover uma cultura empresarial ética é fundamental, incentivando a concorrência saudável e repudiando claramente as práticas anticompetitivas, estabelecendo canais de denúncia anônima para que empregados possam relatar possíveis violações sem medo de retaliação, divulgando amplamente esses canais e encorajando seu uso.

Além disso, as empresas devem monitorar continuamente o ambiente regulatório para se manterem atualizadas sobre as mudanças nas leis de concorrência e trabalho, participando de seminários e workshops organizados por entidades reguladoras e associações profissionais.

O caso do CADE envolvendo a indústria de saúde destaca a importância de monitorar e regular práticas anticompetitivas no mercado de trabalho, responsabilizando as empresas por condutas que restringem a concorrência e prejudicam os trabalhadores, com a aplicação rigorosa da legislação concorrencial sendo fundamental para promover um ambiente de trabalho saudável e competitivo, garantindo melhores condições para todos os envolvidos.

A intersecção entre direito do trabalho e direito concorrencial exige uma abordagem integrada para assegurar que os mercados funcionem de maneira justa e eficiente, com as empresas que implementam práticas robustas de compliance e promovem uma cultura ética não só evitando sanções legais, mas também contribuindo para um mercado de trabalho mais justo e competitivo, beneficiando toda a sociedade.

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