Muito mais que prejudicar os debates de ideias e propostas dos candidatos e interferir nos resultados dos pleitos, a publicação de conteúdos e notícias falsas têm um poder avassalador de alterar os destinos do país e de manchar a tão desejada e jovem democracia brasileira.
Com narrativas criadas com base em desinformação, deturpações, preconceitos, radicalismos e ufanismos, as chamadas fake news têm se tornado meios eficazes para a ascensão de grupos populistas e extremistas ao poder ao redor do mundo e, portanto, possibilitado a instalação de regimes autoritários em diversos países.
Cabe destacar que essa desinformação não é novidade, muito menos exclusividade dos tempos atuais.
O conceito pós- verdade é efetivamente novo – foi eleita palavra do ano de 2016 pelo Dicionário Oxford - contudo, é marca da história do Brasil e do mundo, já que se refere à arte de manipular multidões, de exaltar as crenças pessoais e emoções, em detrimento da veracidade.
Desde os primórdios, os acontecimentos são contados sob a ótica dos vencedores, com enfoque no que interessa ser dito ou destacado.
A inserção nesse contexto da internet, da popularização das redes sociais e dos smartphones, vem dando nos últimos anos outra dimensão a esse problema, pois acaba criando e ampliando uma rede de desinformação e de difusão de notícias inverídicas em uma rapidez nunca antes vista.
Esse cenário é ainda alimentado pela falsa sensação de anonimato, invasão de páginas e outros cibercrimes que buscam os ataques, violência ou dar tons de normalidade para discursos falaciosos e a ações segregacionistas, nazistas ou fascistas.
Mas como combater essa indústria de desinformação e ao mesmo tempo preservar um dos mais sagrados direitos fundamentais constitucionais, alicerce da Democracia, que é a liberdade de expressão?
Jamais compactuaremos com a censura ou qualquer forma de violação desse direito, como já tivemos em um período recente da história do nosso país, mas é preciso destacar que nenhum direito é ilimitado ou absoluto e a prática de fake news é crime e acaba resvalando em outros direitos, como o à informação.
A propagação dessas mentiras acaba por interferir no direito do cidadão de acesso à informação, pois claramente aqui está implícito o compromisso com a verdade.
Quando esse processo é corrompido, há o impedimento do exercício transparente e livre da cidadania e a democracia, em sua essência, mais uma vez é atingida.
Neste caso, garantir o fluxo de informações confiáveis e transparentes significa a possibilidade de o cidadão construir suas opiniões a partir da verdade.
Considerando que essas falsas informações circulam em um ambiente líquido, volátil e instável, é difícil apresentar um mecanismo efetivo para o seu combate.
Temos visto um bom avanço dos debates do legislativo e do judiciário em torno do tema, principalmente a partir do segundo semestre de 2021, e ainda a própria regulação de empresas e mídias sociais para o enfrentamento às fake news, mas precisamos de mais.
Por isso, é preciso a união entre os governos, as empresas e a sociedade para enfrentar esse problema, com a adoção de medidas de identificação e punição dos envolvidos, conforme já dispõe o §3º do artigo 326-A do Código Eleitoral, que em suma dispõe que incorrerá no delito, quem comprovadamente ciente da inocência do denunciado e com finalidade eleitoral, divulga ou propala, por qualquer meio ou forma, o ato ou fato que lhe foi falsamente atribuído.
Como cidadãos devemos ter o compromisso de analisar as notícias antes de propagá-las, replicá-las ou compartilhá-las, checando a sua veracidade, não nos rendendo à tentação daquelas que são do nosso desejo ou crenças.
Desse movimento depende a manutenção da democracia brasileira e as convicções políticas partidárias não podem nos levar à cegueira que destoa da notícia real e verdadeira.
Nestas eleições, mais que o ato de votar, o exercício da cidadania também está atrelado ao combate à desinformação, à disseminação de notícias falsas e ao compromisso com a verdade.