Muito se ouve falar que “de médico, economista e técnico de futebol, todos temos um pouco”. O simpático ditado se refere ao fato de que todos temos opinião sobre os temas abarcados por essas profissões, mesmo sem ter uma vivência prática ou um estudo aprofundado.
É comum em mesas de bar, ou na “pelada” do fim de semana, a discussão e a “criação” de várias teses acerca desses assuntos. A famosa frase, no entanto, na maioria das vezes, também carrega um viés perigoso, principalmente quando se criam alguns consensos falsos, reforçados por pessoas em alta evidência.
É comum que digam que gastos do governo são importantes para impulsionar a economia. Em alguns casos, o inglês (John Maynard) Keynes é, inclusive, citado para justificar a afirmação. Mas muitos não percebem que esse aumento proposto pelo economista ocorreu em condição específica: a depressão econômica estadunidense, quando houve muito desemprego e capital disponível, época que permitia aumentar a produção sem aumento de gastos.
Agora, imagine essa mesma prescrição para uma economia aquecida e no ponto crescente de custos empresariais, com salários, depreciação e manutenção. Claro que a empresa aceita produzir mais, mas apenas se receber um preço maior pela compensação desse encarecimento. Nesse ponto, uma adição de custos do governo se traduzirá apenas em aumento de preços e piora nas condições inflacionárias. No futuro, esse cenário acarretará menos investimentos (e menos crescimento).
O mesmo se aplica à discussão dos juros: todos opinam, e o ambiente se torna perigoso. É óbvio que todos desejam taxas menores para investir e consumir. Ninguém gosta de juros nas alturas. Mas esse deveria ser um debate técnico, com pessoas que estudaram a fundo as relações científicas e o histórico de países na mesma situação. Baixar os juros precipitadamente, além de não incentivar investimentos, acaba prejudicando todo o crescimento de longo prazo.
É importante lembrar que o ambiente inflacionário no Brasil sempre carrega um perigo: a inércia. O País se protegeu da inflação muito alta por muito tempo, adotando o aumento de preços como estratégia. Esse episódio traumático ainda está enraizado na memória das pessoas, e qualquer processo persistente semelhante pode fazer voltar o fantasma. Sem contar que, além de a política fiscal não ajudar, o governo ainda fornece uma boa parte do crédito subsidiado, o que diminui a potência da política monetária: se esse crédito já tem juros fixos, aumento na Selic não fará efeito algum.
Assim, essas opiniões variadas (e nem sempre embasadas) só atrapalham um debate sério. Apesar de serviços e expectativas estarem convergindo para números melhores, ainda se apresentam longe dos ideais. Além disso, pressionar o Banco Central (Bacen) agora jogaria contra interesses de longo prazo.
Aqui vale ressaltar que, para sair dessa armadilha, antes de fomentar o investimento público, o Brasil precisa incentivar o privado (que busca ambiente técnico e sem pressões) para garantir caixa, e polêmicas que geram mais calor do que luz prejudicam esse intento e pioram as condições de melhoria dos indicadores.
Não podemos colocar “o carro na frente dos bois”. Os números do Produto Interno Bruto (PIB) confirmam todo esse receio, pois não temos espaço para erros, principalmente para repetir aqueles do passado.