São Paulo
DECISÃO
NORMATIVA 3 CAT, DE 16-8-2002
(DO-SP DE 17-8-2002)
ICMS
ARGAMASSA
Incidência
Fixa entendimento sobre a incidência do imposto no fornecimento de argamassa comum para obras de construção civil.
O COORDENADOR
DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, tendo em vista o disposto
no artigo 522 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n.º 45.490,
de 30-11-2000, DECIDE:
1. Fica aprovada a resposta dada pela Consultoria Tributária, em 24 de
maio de 2002, à Consulta n.º 217/02, cujo texto é reproduzido
em anexo a esta Decisão.
2. Conseqüentemente, com fundamento no inciso II do artigo 521 do Regulamento
do ICMS, ficam reformadas todas as demais respostas dadas pela Consultoria Tributária
e que, versando sobre a mesma matéria, concluíram de modo diverso.
3. Esta Decisão produzirá efeitos a partir da sua publicação.
“Resposta à Consulta nº 217/02:
1. A Consulente, empresa comerciante varejista de materiais de construção
em geral, localizada no Município de São José do Rio Preto/SP,
pergunta a respeito da “incidência de ICMS na preparação
e comercialização de argamassa”, já que o Município
vem pleiteando recolhimento de ISS sobre essa atividade econômica. Esclarece
que “não prestamos os serviços de colocação
do reboco nas paredes da obra, apenas comercializamos”.
2. Junta à petição de Consulta decisões administrativas
do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) referentes aos Processos DRT 6 –
2259/90 (Câmaras Reunidas), DRT 4 – 3868/82 (6ª Câmara),
DRT 11 – 3802/91 (2ª Câmara Efetiva), DRT 7 – 1150/80
(2ª Câmara Efetiva), DRT 6 – 2140/85, DRT 6 – 761/86
(7ª Câmara Especial), que firmaram jurisprudência administrativa
pela incidência de ICMS, e o Acórdão do Recurso Especial
nº 189.329-SP, do STJ, que decidiu pela incidência de ISS.
3. No que interessa diretamente ao tema consultado, duas formas de incidência
do ICMS devem ser ressaltadas.
4. Há incidência sobre operações relativas à
circulação de mercadorias, ex vi do disposto no artigo 2º,
I, da Lei Complementar nº 87/96.
5. Há incidência, também, sobre o fornecimento de mercadorias
com prestação de serviços sujeitos ao ISS, quando a lei
complementar expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual
(artigo 2º, V, da Lei Complementar nº 87/96). A Lista de Serviços
anexa ao Decreto-Lei nº. 406/68, que foi recepcionada pela Constituição
Federal de 1988 como lei complementar, determina, em seu item 32 (redação
dada pela Lei Complementar nº 56/87) a incidência do ISS sobre:
“Execução, por administração, empreitada ou
subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas
e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços
auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas
pelo prestador de serviços, fora do local da prestação
de serviços, que fica sujeito ao ICM)”
6. Para que a atividade em exame sujeite-se ao ICMS, é portanto necessário,
alternativamente:
(1) que se trate de simples circulação de mercadorias, independente
da execução, por empreitada ou subempreitada, de obra de construção
civil (item 4 supra), ou
(2) que o fornecimento de argamassa, embora vinculado a empreitada ou subempreitada
de obra de construção civil, corresponda a um fornecimento de
mercadorias produzidas fora do local da prestação de serviços
(item 5 supra, pela exceção descrita entre parênteses),
ou ainda
(3) que o fornecimento de argamassa, embora corresponda a um fornecimento de
mercadorias produzidas no local da prestação de serviços,
não esteja nem vinculado à empreitada ou subempreitada de obra
de construção civil e nem esteja compreendido na execução
de serviço auxiliar ou complementar (item 5 supra, pelo texto principal,
que se reduz à situação da primeira hipótese acima).
7. Trata-se então de verificar se ocorre circulação de
mercadorias, correspondente a algum negócio jurídico qualquer
(compra e venda etc.) ou se há prestação de serviços
tal que, pela sua natureza, ocorre apenas fornecimento de bens materiais que
a acompanham. Somente então poder-se-á verificar alguma das três
hipóteses do item 6.
8. Na solução da questão, impõe-se o exame de um
precedente importante na jurisprudência brasileira: o do fornecimento
de concreto para construção civil. Ou seja, o porquê de
o fornecimento do concreto para obras ser considerado prestação
de serviços e a verificação da semelhança ou dessemelhança
dessa atividade com o fornecimento de argamassa.
9. Segundo a Súmula nº. 167, do Superior Tribunal de Justiça,
“o fornecimento de concreto, por empreitada, para construção
civil, preparado no trajeto até a obra em betoneiras acopladas a caminhões,
é prestação de serviço, sujeitando-se à incidência
do ISS.”
10. E em função dessa Súmula, o STJ julgou o Recurso Especial
nº. 11.979-0 – SP, dando provimento ao recurso contra o acórdão
do Tribunal de Justiça, pela incidência de ISS, e contra a incidência
de ICMS, com o fundamento de que “o preparo e fornecimento de argamassa
para construção civil, mediante empreitada, é serviço
da mesma natureza jurídica que a elaboração de concreto,
em iguais circunstâncias”.
11. Ainda sobre esse precedente, o Tribunal de Justiça havia decidido
pela incidência do ICMS no fornecimento de argamassa em obras de construção
civil com o acolhimento do argumento de que não há identidade
entre argamassa e concreto, já que a obtenção deste “exige
qualificação técnica pois a dosagem dos materiais que o
compõem varia, conforme as necessidades, não só de cada
construção, mas também de cada elemento desta, ao qual
se destine”.
12. No julgamento do Recurso, o Sr. Min. Humberto Gomes de Barros (Relator)
afastou a fundamentação anterior dizendo que “o dispositivo
legal nega qualquer valor à qualificação técnica
do empreiteiro”, que “sob este enfoque, a preparação
e fornecimento da argamassa mediante empreitada é serviço de natureza
jurídica semelhante ao preparo e à aplicação de
concreto” e que “a prova de qualificação técnica,
exigida pelo V. Acórdão é despicienda”.
13. Para a melhor compreensão do caso deve-se referir a precedentes do
STF, nas décadas de 70 e de 80, que culminaram com a fixação
da jurisprudência da incidência do ISS, e não do ICMS, sobre
o fornecimento de concreto para obras.
14. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 82.501, em 5 de dezembro
de 1975, o Sr. Ministro Moreira Alves considerou que “a preparação
do concreto, seja na obra – como ainda se faz nas pequenas construções
–, seja feita em betoneiras acopladas a caminhões, é prestação
de serviços técnicos, que consiste na mistura, em proporções
que variam para cada obra, de cimento, areia, pedra britada e água ...”
(grifos originais), que “para a concretagem, há duas fases de prestação
de serviços: a da preparação da massa, e a da sua utilização
na obra”. Cita Parecer de Ruy Barbosa Nogueira, onde, verificando similitudes
entre o processo de concretagem então sob exame e uma solução
dada pelo direito norte-americano para o serviço tipográfico,
o professor diz que “... no caso das tipografias, embora estas empreguem
a tinta e o papel, elas destroem o papel em branco que como tal deixa de ter
valor comercial e somente vale para o cliente que o encomendou, do que se segue
que o impressor apenas prestou um serviço, não vendeu um bem corpóreo
... igualmente a Consulente, fazendo a mistura dosada para o cliente, só
a este aproveita esse serviço e o cimento, a pedra, a areia e a água
se tornam inutilizáveis e fora do comércio” (grifos originais).
Conclui o eminente Ministro que “... a mistura física de materiais
não é mercadoria produzida pelo empreiteiro, mas parte do serviço
a que este se obriga, ainda quando a empreitada envolve o fornecimento de materiais.
Material, mesmo misturado para o fim específico de utilização
em certa obra, não se confunde com mercadoria.”
15. O entendimento acima foi confirmado nos REsp. 91.111-1 (DJ de 7-12-79) e
93.508-8 (DJ de 10-4-81), firmando jurisprudência, posteriormente confirmada
pela já transcrita Súmula do STJ.
16. Então, o fornecimento de concreto para obra é serviço,
onerado pelo ISS, porque é uma espécie de subempreitada e como
tal inclui-se na descrição do item 32 da Lista de Serviços.
Seu fornecimento se dá sob responsabilidade técnica e a preparação
do material é personalíssima, ou seja, de maneira que o bem fornecido,
então fora do comércio, atende única e exclusivamente as
específicas necessidades da obra.
17. O contrato de empreitada é espécie de contrato de prestação
de serviços, cuja especificidade da obrigação de fazer
consiste na “execução da obra conforme as instruções
recebidas ou as regras técnicas que se devem observar em sua realização”
(Orlando Gomes, Contratos, 18ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, item
232). “A dúvida que a muitos assalta provém de se não
distinguirem, como merecem, a obrigação de fazer (realização
da obra) e a obrigação de entregar a coisa depois de concluída;
esta última, vinculada à primeira, não se confunde com
a obrigação de dar que é execução do contrato
de compra e venda” (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições
de Direito Civil, vol. III, 10ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, item
242, que nesse trecho faz referência ao Tratado de De Page). A opinião
da doutrina converge com a do STF e com a Súmula do STJ.
18. Compreendido o direito, partimos para o exame da situação
da consulta, propriamente dita.
19. O caso do concreto é claro. São tantas, tão variadas
e especializadas as tecnologias para as estruturas do concreto que há
muito tempo surgiu um novo ramo de negócio baseado nessa especialização.
Há especialistas em concretos particulares, segundo o traço (composição),
as reações químicas, o tipo e a quantidade de ferro, etc.,
que atendem os requisitos de cálculo estrutural. Então, diante
dessa realidade, os construtores de obras não se preocupam com o concreto
de suas obras. Terceirizam o projeto e a manufatura. Contratam empresas especialistas,
em condição negocial de subempreitada. Note-se bem: não
é que haja subempreitada porque o negócio do concreto é
especializado, mas a especialização, sem dúvida determinante
na formação desse ramo de negócio, que levou as empresas
a trabalharem com a co-responsabilidade do concreteiro, na forma de subempreitada.
20. Segundo a Consulente, seu negócio consiste na “preparação
e comercialização de argamassa”. E continua: “não
prestamos os serviços de colocação do reboco nas paredes
da obra, apenas comercializamos”.
21. Do que nos foi informado, compreende-se que a Consulente não tem
vínculo com a realização das obras de construção
civil para as quais fornece argamassa. Que, na execução de seus
contratos, há simples alienação do produto com sua entrega
ao construtor, cujo adimplemento contratual ocorre em função de
obrigação de dar, sem qualquer obrigação de fazer.
22. Isso é possível, pois ao contrário do concreto, que
é calculado para a obra – é elemento estrutural, por excelência
–, e assim tem vocação para ser fornecido sob a forma negocial
de serviço, a argamassa, embora preparada para alguma aplicação
específica, como para acabamento, para fixação de pisos
e azulejos, para agregar tijolos, não é produzida com o intuito
de ser aplicada em alguma obra em especial. Não perde a condição
de bem do comércio pois, durante seu preparo, pode perfeitamente ser
destinada a uma grande variedade de obras de construção civil,
desde que para a finalidade para a qual está sendo preparada: acabamento,
fixação de pisos, etc. O concreto, ao contrário, já
não tem qualquer possibilidade de voltar ao mercado desde o início
da mistura da pasta. Não serve a nenhuma outra obra, senão para
aquela que foi calculado e preparado.
23. Nestes termos, não se pode concordar com o acórdão
do REsp nº. 11.979-0 – SP, pois seu fundamento, salvo melhor juízo,
está equivocado. Se é certo que “o preparo e fornecimento
de argamassa para construção civil, mediante empreitada, é
serviço da mesma natureza jurídica que a elaboração
de concreto, em iguais circunstâncias”, essas “iguais circunstâncias”,
contudo, não se verificam aprioristicamente. É verdade que não
é necessário que o fornecedor de argamassa tenha qualificação
técnica; contudo, não é porque “a prova de qualificação
técnica ... é despicienda” que o fornecedor se torna “empreiteiro”.
Para ser empreiteiro ou subempreiteiro, a pessoa deve estar envolvida e comprometida
com a obra em si ou com alguma realização dela.
24. Do que foi colocado na petição de consulta, o fornecimento
da mercadoria (argamassa) não tem qualquer relação com
a execução de empreitada ou subempreitada ou de serviços
auxiliares ou complementares concernente à construção civil.
Trata-se, simplesmente, de operação de saída, de bem que
a Consulente pode ter industrializado ou não. Saída de mercadoria,
a título de venda, sem afetação necessária de destino.
É circunstancial seu destino a obra de construção civil.
Ao contrário do concreto, que tem aplicação certa, a argamassa
é entregue para aplicação segundo a decisão do construtor
ou empreiteiro.
25. Pelas razões acima, por se tratar a operação de simples
circulação de mercadorias, independente da execução,
por empreitada ou subempreitada, de obra de construção civil,
a operação está sujeita ao ICMS, por incidência do
disposto no artigo 2º, I, da Lei Complementar nº 87/96.
26. Somente o fornecimento de argamassa produzidas no local da prestação
de serviços pela própria empreitada ou por alguma subempreitada
de obra de construção civil, não corresponderá a
um fornecimento de mercadorias e não se sujeitará ao ICMS.
27. Por fim, esta resposta restringe-se a operações com argamassa
comum, sem função estrutural, normalmente encontrada em qualquer
obra de construção civil. Não se aplica a estruturas de
argamassa armada ou compostas por argamassa armada e concreto, nem a misturas
de argamassa com produtos químicos plastificantes, etc., cujos fornecimentos
envolvem projetos específicos para aplicações predeterminadas.
As conseqüências tributárias dessas situações
particulares devem ser examinadas à vista da descrição
completa dos fatos que envolvem esses fornecimentos.”
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