No início deste mês, foi publicado decreto que alterou o estatuto do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para incluir mudanças na forma de distribuição de dividendos para seu acionista, a União. Pela norma, o banco de fomento fica autorizado a pagar dividendos complementares, antes que as reservas de lucro para futuro aumento de capital e para margem operacional atinjam os limites previstos.
Somado a isso, na semana passada foi divulgada uma mudança na contabilidade da dívida exposta à variação cambial da Petrobras, que permitirá à companhia melhorar o resultado do segundo trimestre em cerca de R$ 7 bilhões, reduzir a exposição cambial em cerca de R$ 70 bilhões e aumentar seu lucro. As novas regras permitirão à estatal registrar, de forma diluída, ao longo dos próximos sete anos, parte do prejuízo causado pela variação cambial na dívida. A parcela exposta ao câmbio, cerca de US$ 50 bilhões conforme dados do fim de março, subiu em reais na mesma proporção em que se valorizou a moeda estrangeira. Para especialistas, essa alteração fará com que aumente o volume de dividendos da petroleira ao governo.
E ainda está previsto para ser anunciado nesta semana um corte adicional de gastos de até R$ 15 bilhões, que se somará aos R$ 28 bilhões prometidos em maio deste ano. O objetivo é cumprir a meta de superávit primário de 2,3% do PIB, ou R$ 110,9 bilhões.
O diretor de Finanças e Economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Storfer, comenta que, apesar do governo aproveitar períodos para tomar medidas, como foi o caso da Petrobras, a sequência feita de ações mostra que não há saídas a não ser usar a "contabilidade criativa" ou emitir títulos públicos via Tesouro - para financiar a dívida.
Por outro lado, ele critica o uso das estatais para conseguir cumprir a meta fiscal. "Essas manobras com estatais é mais do que perigoso, é imprudente, irresponsável, porque afeta a reputação da empresa, ou seja, mostra aos investidores que são companhias sujeitas às interferências do governo. O resultado é que por conta de outros interesses a empresa paralisa [não investe]", diz o especialista, que não descarta que o governo também mude a contabilidade de outras estatais.
O professor do Ibmec, Mauro Rochlin, concorda com Storfer. "Essas medidas mostram um desespero, além de ser arriscado depender de resultados das estatais", avalia. Na visão dele, o ideal seria o governo assumir um compromisso de atingir uma meta "mais factível". "Com uma meta prevista de 1,5% do PIB, que dá em torno de R$ 60 bilhões, o governo consegue manter sua credibilidade, se é que ainda a tem", aponta. Para o diretor da Anefac, para se ter credibilidade bastaria que o governo assumisse que será difícil cumprir a meta, mas que o esforço para tanto será feito.
Objetivo
A meta de superávit primário do setor público consolidado neste ano é de R$ 155,9 bilhões, o equivalente a 3,1% do PIB. Mas o governo trabalha com um superávit de 2,3% do PIB. Em 2013 até maio, o superávit atingiu 29% da meta total, ao registrar uma economia de R$ 46,7 bilhões, segundo o último relatório do Banco Central (BC). No mesmo período de 2012, o superávit foi de R$ 62,9 bilhões.
Contudo, no ano até maio, o resultado primário das estatais está negativo em R$ 821 milhões. Somente no quinto mês de 2013, o déficit foi de R$ 790 milhões.
No caso do corte de até R$ 15 bilhões, o professor do Ibmec afirma que será muito difícil ser atingido visto que os salários do serviço público não podem ser contingenciados e os gastos com custeio cresceram 7% no primeiro quadrimestre.
Ele cita ainda levantamento realizado pela organização não-governamental (ONG) Contas Abertas, com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), que mostra que as despesas do governo apresentaram aumento real de 6,6%, para R$ 1,01 trilhão, no primeiro semestre, em relação ao mesmo período de 2012. Esses números são diferentes das informações do Tesouro e do Planejamento, porque não consideram os gastos com o programa Minha Casa Minha Vida como investimento.