Uma auditoria realmente independente passou a ser o santo graal da
contabilidade. As pessoas não se dão mais por satisfeitas com a ficção de independência contida nas leis das sociedades anônimas.
Atualmente, na teoria, os acionistas recorrem a auditores para atestar que os negócios da empresa na qual investiram são como os diretores da companhia dizem que são. Os acionistas escolhem o auditor e sua remuneração em votação na assembléia geral anual.
Na prática, a situação é bem diferente. É o diretor financeiro e o comitê de auditoria que escolhem efetivamente o auditor externo. E é a equipe financeira que lida, a maior parte do tempo, com o auditor, depois que este é nomeado.
As negociações com os auditores, caso surja algum problema na forma como os balanços financeiros são compilados, são de responsabilidade do diretor financeiro e sua equipe. A sintonia fina da contabilidade "verdadeira e justa" é uma questão reservada para o diretor financeiro e a empresa auditora. O parecer dos auditores descrevendo qualquer ponto fraco nos sistemas e sugerindo correções não vai para os acionistas, mas para a equipe financeira.
Muitos sustentam que o sistema funciona bem. Os problemas que precisam ser examinados são encaminhados para as pessoas, nos dois lados, que melhor entendem as questões. Também fica claro, no entanto, que a independência prevista na lei societária está longe de ser óbvia ou transparente.
Recentemente, ressurgiu uma proposta para recriar uma independência que seja clara e óbvia. Foi apresentada pelo professor de contabilidade Joshua Ronen, da Stern School of Business, da New York University. Sua idéia é inserir outro intermediário na relação e, portanto, recuperar a independência desejada.
Os detalhes são complexos, mas, para colocar de forma simples, a solução do professor Ronen é que as empresas garantam a integridade de seus balanços e que façam um seguro dessa garantia. As seguradoras contratariam e fiscalizariam os serviços do auditor.
A teoria também traz solução para três questões polêmicas. Resolve o problema do conflito de interesses dos auditores ao lidar com o cliente. Deixa a questão da qualidade dos balanços muito mais visível. E também possibilita um julgamento público da qualidade dos auditores. O honorário pago a eles pelas seguradoras refletiria o julgamento tanto de sua capacidade como do risco relativo em contratar seus serviços.
"Solucionamos o problema eliminando conflitos e deixando clara a qualidade dos balanços e dos auditores", diz o professor Ronen. Também se tornaria, acredita um indicador da integridade da empresa e, como tal, um referencial a ser usado pelos investidores. Sua idéia é que por meio do processo proposto por ele surja uma classificação de seguro da qualidade dos balanços. "O executivo a usaria para anunciar sua santidade", diz.
Na teoria, as idéias de Ronen podem parecer atraentes, mas na prática há claras dificuldades. "É uma solução elegante para a questão da independência e informaria o risco dos balanços. Mas, não seriam apenas as empresas de seguros que teriam que assumir o trabalho. [A proposta] precisaria dos [órgãos] reguladores e de mudanças legislativas. Seria necessário algumas mudanças profundas no sistema", observou o executivo-chefe da consultoria Independent Audit, Jonathan Hayward.
A proposta exigiria um alto nível de determinação em todo o mundo para levar adiante leis que respaldem o sistema. Também traria à tona as principais diferenças entre a auditoria dos balanços no Reino Unido e nos Estados Unidos.
O que seria segurado nos Estados Unidos seria a perda dos investidores com a queda das ações. No Reino Unido, seria a possível perda caso atos de negligência resultassem na quebra da empresa.
Claramente, a questão de uma real independência no processo de auditoria está na dianteira das discussões e embora seja improvável que a idéia do professor Ronen entre em vigor, está atuando como catalisador para mais idéias.
Fonte: Valor Econômico