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Um tiro no escuro

A escolha profissional é um caso típico de tomada de decisão na ausência de informações

15/09/2014 08:32

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Um tiro no escuro

O conto Profession, publicado em 1957 por Isaac Asimov, retrata a Terra em um futuro distante e distópico. As crianças são educadas por um sistema central, que liga diretamente seus cérebros a um computador. As futuras profissões são definidas com base em um algoritmo. Não cabe aos indivíduos escolherem seus ofícios. Profession é uma entre muitas obras de ficção científica a tratar da questão da escolha ou direcionamento profissional.

O tema também ocupa lugar de destaque entre as preocupações de jovens, pais, psicólogos, educadores e gestores da área. No Brasil, temos uma associação de orientadores profissionais e uma revista científica dedicada ao tema. Em nosso país, todos os anos, no segundo semestre, centenas de milhares de jovens preparam-se para a maratona dos exames vestibulares.

Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o Brasil ultrapassou, em 2012, a marca de 7 milhões de alunos no ensino superior. Eles estão matriculados em 32 mil cursos, oferecidos por mais de 2 mil instituições de ensino. Nosso sistema superior de educação cresceu aceleradamente desde o fim da década de 1990 e quase duplicou nos últimos dez anos.

No entanto, o crescimento e o gigantismo não foram ainda suficientes para atender à demanda por formação de alta qualidade. Nos cursos mais procurados e nas instituições de maior renome, a relação candidato/vaga frequentemente supera a dezena e vez ou outra se aproxima da centena. O funil de acesso coloca legiões de pais e filhos à beira de um ataque de nervos.

Nos últimos anos, a realização de um curso superior tornou-se aspiração de novos contingentes de jovens, antes alijados da universidade por barreiras econômicas. Em paralelo, visando atender ao novo “mercado”, nasceram e prosperaram instituições privadas de ensino superior com um olho na educação e outro no bolso, não necessariamente nessa ordem. Na esquina ideológica oposta, o sistema público, caro e anacrônico, salta de crise em crise, a vergar sob o peso de querelas políticas, governança excêntrica e interesses corporativistas. Enquanto isso, o mundo gira e o mercado de trabalho é convulsionado por estripulias econômicas, algumas profissões emergem e outras submergem, enquanto certas carreiras rompem as fronteiras tradicionais.

No meio da confusão, nossos jovens enfrentam o descabido desafio de, aos 17 anos, definir o próprio futuro. Os manuais de autoajuda vocacional costumam ser pródigos em sugestões tão sensatas quanto inexequíveis: conheça a si próprio, as profissões, os profissionais, trabalhe e experimente. Alguns jovens têm vocação clara, mas são raros. Outros pensam tê-las, mas titubeiam diante dos primeiros choques de realidade. A maioria lança-se semiconsciente ao mar, torcendo para que uma corrente amiga a leve a um porto seguro.

A escolha profissional é um caso típico de tomada de decisão na ausência de informações. Quem sou eu? Quais são meus potenciais? O que quero da vida? São perguntas básicas, mas difíceis de responder aos 17 anos. A outra ponta não é mais simples. Como estará o mercado de trabalho daqui a quatro ou cinco anos? Quais serão as melhores profissões do futuro? O que me trará satisfação? O que me garantirá uma vida confortável?

E, não bastassem as dificuldades naturais, as paixões e as ansiedades envolvidas, as decisões são tomadas em um teatro de consumo, no qual escolas secundárias competem pelas maiores taxas de sucesso no vestibular, cursinhos vendem seus serviços e as novas instituições de ensino tentam atrair recrutas para suas “propostas diferenciadas”.

Não é incomum muitos jovens iniciarem cursos superiores, os interromperem pouco depois e tentarem outros caminhos. Há também aqueles fiéis à escolha original que, mesmo frustrados, terminam o curso e seguem a padecer pela vida profissional afora. O custo da escolha malfeita é alto para os jovens, seus pais e a sociedade. Mais sábios seriam, na opinião de alguns, os nossos pares do Hemisfério Norte, que oferecem aos seus universitários a oportunidade de inícios com conteúdos mais genéricos e consequente adiamento das decisões profissionais para momentos de maior maturidade e lucidez.

Por Thomaz Wood Jr.

Fonte: Carta Capital

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