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Terceiro Setor: Burocracia brasileira prejudica ONGs sérias e favorece fraudes

06/06/2011 14:10

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Terceiro Setor: Burocracia brasileira prejudica ONGs sérias e favorece fraudes


Entidades reivindicam marco regulatório para corrigir distorções que dificultam a atuação das organizações


A falta de uma legislação específica para o terceiro setor cria uma situação paradoxal no Brasil. Organizações não governamentais cuja atuação é reconhecidamente ética e séria enfrentam diversos entraves burocráticos para trabalhar. Já ONGs de origem duvidosa se aproveitam da inexistência de fiscalização e frequentemente se envolvem em casos de corrupção.

Na falta de um “estatuto do terceiro setor”, outras legislações são aplicadas, o que não reconhece a especificidade das organizações. As ONGs no país são definidas como associações ou fundações juridicamente. Nas fundações é mais difícil ocorrer desvio de verba porque há uma fiscalização constante do Ministério Público (MP). Já as associações só são auditadas quando há algum tipo de denúncia, o que facilita a prática de fraudes.

As instituições sérias enfrentam verdadeiro martírio para conseguir determinadas qualificações do governo para mostrar que são idôneas. Para conseguir o certificado de utilidade pública federal, por exemplo, há uma série de exigências que, às vezes, demandam anos para serem cumpridas. Mas, paradoxalmente, quem quer fraudar tem relativa facilidade.


Exemplos

Enquanto, por exemplo, integrantes de uma entidade de Londrina foram presos no início do mês acusados de desviar milhões de reais dos cofres públicos, a Pastoral da Criança precisou abrir uma sede no Uruguai para dar continuidade ao trabalho da médica Zilda Arns, que morreu no Haiti em janeiro do ano passado.

Uma das últimas realizações de Zilda foi criar a Pastoral da Criança Internacional. O objetivo era levar a bem sucedida experiência no Brasil para outras nações pobres. Mas, em 2008, a entidade enfrentou dificuldades por causa da burocracia brasileira. A instituição se viu obrigada a sair do país – e encarecer os custos do trabalho – porque não podia enviar recursos ao exterior.

Professor de Direito Admi­­nis­­­­­trativo da Universidade de São Paulo, Gustavo Justino de Oliveira argumenta que, em função da falta de legislação, as ONGs vivem uma verdadeira insegurança jurídica no país. “Há uma lacuna que faz com que, às vezes, a mesma regra aplicada a uma empresa valha para as ONGs. Por outro lado, muito dos escândalos hoje ocorrem em função da falta de leis.” Oliveira lembra que as instituições do terceiro setor cumprem papel essencial na consolidação da democracia brasileira.

Para a procuradora Isabel Claudia Guerreiro, coordenadora do centro de apoio do terceiro setor do Ministério Público do Paraná, existe dificuldade para fiscalizar. Quando a instituição, por exemplo, recebe repasses de dinheiro público há fiscalização, mas somente aquele determinado repasse será auditado. Ela afirma que, além de melhorar o monitoramento financeiro, é preciso atentar se a ONG atingiu a finalidade estipulada no convênio com o poder público.


Futuro

Diretor-executivo do Instituto Pro Bono, o advogado Marcos Fuchs diz que as ONGs precisam se profissionalizar e os advogados também precisam se especializar no terceiro setor. O Instituto Pro Bono tem o objetivo de disseminar entre a classe jurídica a prestação de serviços gratuitos para associações e fundações. Segundo ele, é preciso mudar a cultura da filantropia no Brasil e para isso é preciso alterar a legislação e trazer benefícios para quem ajuda.

Ivo Les-Baupin, diretor da Associação Brasileira de Orga­­nizações Não Governa­­mentais, diz que é uma demanda do setor a criação de um marco regulatório, mas há também outros pontos. Uma grande reivindicação das entidades é a criação de uma lei que estabeleça um porcentual do orçamento para ser doado às instituições, que não ficariam sujeitas a mudanças de governo e questões políticas.


Falta de legislação encarece atuação social
Coordenador da Pastoral da Criança Internacional, Nelson Arns explica que o dinheiro angariado vem de doações de entidades do exterior, portanto o trabalho no Brasil não seria afetado. Mas, segundo a legislação, a verba recebida por ONGs brasileiras não pode ser destinada para ajudar outros países. A entidade chegou a falar com os governos Lula e FHC para tentar uma mudança na lei, mas não teve resposta. Por orientação do Ministério das Relações Exteriores, a Pastoral abriu um escritório no Uruguai, que tem uma legislação mais atualizada. Esta restrição pode ser uma das explicações para o baixo número de instituições brasileiras com atuação mundial.

A entidade tem um custo operacional muito baixo porque boa parte do trabalho é feito por um batalhão de voluntários e a sede no exterior acabou trazendo gastos desnecessários, como viagens, por exemplo. Mas, em contrapartida, a Pastoral não precisa enfrentar a burocracia de cada país em que atua. Isso porque sem o escritório no Uruguai seria necessário abrir uma sede em cada um dos 17 países em que atua.

Outro problema enfrentado pela Pastoral é a prestação de contas para o governo federal. Um convênio com o Ministério da Saúde fez com que a instituição tivesse de contratar 40 digitadores para cadastrar 354 mil notas fiscais, sendo 79 mil com valores abaixo de R$ 10 e 152 mil com valores entre R$ 10 e R$ 50. “Nosso trabalho é muito barato, mas é encarecido pela burocracia”, diz Nelson Arns.

Em Curitiba, a ONG Aliança Empreendedora, que trabalha com apoio a empreendedores de baixa renda, precisou abrir uma microempresa para comercializar os produtos fabricados pela população carente atendida. O paradoxal é que a microempresa paga menos impostos do que a ONG.









Fonte: Gazeta do Povo

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