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É de criança que se empreende

Por que estimular o empreendedorismo nas escolas, desde cedo, pode ajudar o país a prosperar e tornar as pessoas mais felizes

04/01/2013 08:28

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É de criança que se empreende

Eles acabaram de sobreviver a um naufrágio. Agora, estão perdidos em uma ilha deserta, expostos ao frio e a animais perigosos. Para sobreviver e conseguir voltar para casa, terão que construir uma cabana segura e um barco resistente, e traçar uma estratégia de fuga. Os tripulantes naufragados têm entre nove e dez anos. Usarão latinhas de alumínio para criar o abrigo e palitinhos de madeira para dar forma à embarcação. Eles não sabem, mas estão aprendendo a empreender.

A atividade descrita acima faz parte das oficinas extracurriculares promovidas em colégios públicos e particulares do Rio de Janeiro pela Escola de Empreendedorismo Zeltzer. “A criança aprende a elaborar soluções criativas e, ao mesmo tempo, compatíveis com problemas reais”, afirma Carla Zeltzer, proprietária da Zeltzer, sobre a metodologia usada, hoje, em 20 instituições de ensino. Formada em Ciência da Computação, Carla teve a ideia de abrir a empresa enquanto procurava colégio para matricular a filha. “Não encontrava um ambiente onde ela pudesse desenvolver suas habilidades ao máximo e ser mais bem preparada para a vida.”

Foram três anos de pesquisa até abrir a escola, em 2005. Por meio de situações-problema, brincadeiras e jogos vocacionais, os alunos, a partir dos nove anos, são estimulados a desenvolver criatividade, organização, trabalho em grupo e planejamento – habilidades necessárias a todo empreendedor. As avaliações são individuais e em grupo. E nada de notas, mas cores (verde, amarelo e vermelho) que indicam os pontos positivos e aquilo que pode ser melhorado. “Não existe certo ou errado.”

O poder de ser o que quiser

Os alunos do terceiro ano do ensino fundamental do colégio particular Porto Seguro, em São Paulo, contam os dias para expor seus talentos na Feirinha de Especialidades, realizada no final do ano letivo. A atividade faz parte da disciplina Matemática e foi criada para os alunos colocarem em prática o que aprendem sobre o sistema monetário. Cada criança recebe R$ 214,56 – em notas destacadas do próprio livro de matemática – para comprar brigadeiros, cupcakes, desenhos, bijuterias e esculturas de argila produzidas pelos coleguinhas das outras salas. “Eles são orientados a fazer aquilo que mais gostam”, diz a professora e coordenadora do terceiro ano do colégio, Luciana Wertheiner. Com base no levantamento do quanto foi gasto, os alunos calculam o preço que cada produto deve custar. “A criança aprende noções de lucro e prejuízo, e que seu trabalho tem valor”, afirma Luciana.

A Feirinha de Especialidades já existe há dez anos no colégio. Há três, o estudante Lucas Magalhães, hoje no sexto ano, participou da experiência. Ele lembra de ter confeccionado adesivos e marca-páginas para livros. “Usei um papel duro e colorido. Recortei e colei tudo sozinho”, diz. "Ficou superlegal e vendi todos os meus produtos rapidinho.” O estudante conta que aprendeu a negociar e fez até uma promoção. “Quem levasse três pagava apenas dois.” Lucas não sabe se vai abrir uma empresa, mas já sabe o que quer ser quando crescer: um grande ilustrador de livros.

Todos nós nascemos com sonhos e vocações. Conseguir explorá-los e torná-los parte de nossas vidas faz com que sejamos comunicadores, professores, médicos, engenheiros, donas de casa, advogados, faxineiros, artistas, administradores, cientistas empreendedores... "É um potencial que faz parte da natureza humana. Está nas atitudes, aspirações e formas de enxergar o mundo”, afirma Fernando Dolabela, professor e consultor em empreendedorismo. “Não pode ser reduzido à abertura de um negócio.”

O poder de transformar

Dolabela afirma que uma das principais falhas das escolas é orientar os alunos a pensar somente no “até ontem”. “Eles aprendem a usar tecnologias e métodos que já existem e que vêm de fora. E não a pensar em soluções para o futuro, a criar o que ainda não foi inventado.”

Há 20 anos, Dolabela desenvolveu uma metodologia interdisciplinar própria que trabalha nas crianças valores como proatividade, autonomia e flexibilidade. O professor é orientado não a dar respostas, mas a oferecer um caminho para que o aluno as descubra sozinho. “As salas de aula passam a ser um ambiente de geração de conhecimento construído em parceria com o aluno.” Implantada por meio de licitações municipais, a Metodologia Empreendedora, como é chamada, já é adotada em mais de duas mil escolas da rede pública de 127 cidades brasileiras, como Belo Horizonte e Londrina.

Mas a resistência por parte de muitas escolas em implementar novas metodologias e adotar disciplinas não exigidas nos vestibulares têm sido um grande obstáculo. Para Mirela Malvestiti, gerente nacional de capacitação profissional do Sebrae, a qualificação dos professores é outro desafio a ser superado . “É muito difícil ensinar algo que não foi aprendido, a passar adiante uma formação que não foi a sua.”

O poder de poder

A professora Jacileide Soares dos Santos não teve aulas de empreendedorismo na escola. Nem na faculdade de Letras, que cursou há 32 anos. Desde 2005, seus alunos do 6º ano da escola estadual Senador Aderbal Jurema, em Jabotão, no interior de Pernambuco, passaram a ter aulas periódicas sobre Introdução ao Mundo dos Negócios. As atividades não são desenvolvidas pelos professores, mas pela organização americana sem fins lucrativos Junior Achievment, que há mais de 90 anos trabalha com programas que fomentam o empreendedorismo em jovens de mais de 120 países. No Brasil desde 2003, a organização conta com o trabalho de funcionários-voluntários de empresas parceiras para preparar e conscientizar melhor as crianças para o mercado de trabalho. Neste ano, os alunos da professora Jacileide vivenciaram, dentro da sala de aula, o processo de fabricação de canetinhas. Divididos em grupos, eles aprendiam, juntos, a montar as canetas e a entender a importância de cada etapa na produção final.

No início, a professora Jacileide ficava desconfiada. “Não sabia aonde eles queriam chegar e qual a importância daquilo tudo”. Hoje, ela já tem a resposta. Percebeu que a educação empreendedora é o caminho mais sustentável para o progresso econômico e para o combate à pobreza no longo prazo. “Muitos alunos não queriam prestar vestibular ou fazer um curso técnico. Tinham medo de disputar as coisas no mundo lá fora, de fracassar”. Segundo a professora, de 2010 para 2011, o número de alunos inscritos em cursos técnicos e vestibulares dobrou – passou de quatro para oito, incluindo todas as turmas do terceiro ano. “A autoestima da nossa comunidade está aumentando a cada ano”, diz a professora Jacileide. “Se eu tivesse tido essa formação, minha vida teria sido tão diferente...”.

Fonte: Epóca

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